Ep. 3: Encurralados. A morte que nos cerca.

O corredor era pequeno e estreito, mais ou menos um metro de largura por três de comprimento e os malditos zumbis se aproximavam cada vez mais.
Virei os pés da cadeira para James e empurrei com toda força, fazendo o cair de costas no quarto em frente ao corredor, corri em sua direção, acertando-lhe a cadeira com toda a força em seu corpo, de nada adiantou. Ele se levantou e tentou me alcançar, empurrei-o com uma pesada no peito, arremessando-o contra a parede, bati mais uma vez no topo da cabeça e eu continuei a golpear seu rosto, com a barra lateral do assento da cadeira, até que ele não se movesse mais.
Aline abriu a porta, correu e me abraçou.
_ Meu Deus, o que é isso, o que está acontecendo? Aline falou em um tom choroso, enquanto me apertava contra si, até ser surpreendida.
_ AH, MEU DEUS, AIDÊ. SOCORRO! SOCORRO!
Ela então pegou a cadeira das minhas mãos e empurrou Aidê até a beira da escada, fazendo-a rolar os degraus, deixando o rastro ensangüentado no mármore branco.
_ O que é isso na sua mão, é sangue, está ferida?
_ Não, é esmalte, eu estava pintando a unha quando vocês me ligaram. Liguei a TV e vi o caos se alastrando, inclusive em outros estados. Eu estava arrumando a mala com roupas e alguns artigos de higiene, quando o James saiu da sala e veio em direção ao meu quarto, ele já estava desse jeito. Tranquei a porta e então ouvi gritos na cozinha, era Aidê, mas não tive coragem de sair para ajudar.
Ouvimos passos, apressados, subindo a escada. Natasha entrou correndo com uma bolsa nas mãos.
_Eu estava na casa de baixo, lá tem dois zumbis, um homem e uma mulher, mas são bem velhos, e são bem lentos também, consegui pegar alguns mantimentos.
_ Sr. Adriano e Sra. Rosa, Aline murmurou, como quem não acreditava no que Natasha dizia.
Eu também engoli a seco e pedi para as meninas fazerem o mesmo na casa da Aline.
_Vasculhem toda a casa em busca de alimentos não perecíveis e possíveis armas, como facas e ferramentas. Peguem o máximo possível. RÁPIDO, VAMOS SAIR LOGO DAQUI.
Enquanto elas faziam isso desci, lembrei que o coroa da casa de baixo tinha um quartinho com ferramentas para cuidar das árvores. Passando pelo corpo de Aidê, vi que havia não só uma mordida, mas sim toda a parte de trás de seu corpo havia servido de refeição, para talvez mais de um zumbi. Os ferimentos coagulados, porém ainda viscosos, eram tão fundos, que deixavam sua coluna exposta. Em silêncio, atravessei o quintal e fui direto apanhar nossas “armas”. Facões, foices, machados, picareta, martelos... Peguei tudo e joguei em uma lona que estava no canto, amarrando as pontas, como uma grande e pesada sacola. Arrastei o pequeno “arsenal” até o portão da rua, o som atraiu a atenção dos velhos, mas moviam-se devagar demais para me alcançar. As meninas também chegaram, fechamos o portão e já na rua começamos a carregar o carro com o que conseguimos.
_ Meninas me ajudem aqui com isso, mas antes, escolham o instrumento que melhor se adaptam.
Abri a grande sacola de lona e peguei um facão, abri a fivela e prendi a bainha ao cinto, Aline pegou uma foice em forma de meia lua e Natasha ficou com um tesourão de poda.
Aline olhou para traz e puxou Natasha pelo braço, gritando.
_ Olha ali, olha ali, meu Deus são muitos, parece um formigueiro.
O número de carros batidos, cadáveres e “comedores de corpos” tinha aumentado ainda mais, desde que passamos para buscar Aline e isso tornava nossa passagem ainda mais complicada.
Tentei dar a partida no carro, mas ele não pegou, o som atraiu a atenção dos zumbis que começaram a vir em nossa direção, tendei dar a partida mais uma vez e nada, apenas o som ecoava na rua sem vida e parecia mais alto a cada vez que eu girava a chave.
Saí do carro e eles saiam de dentro dos outros carros estacionados na rua, largavam os corpos que comiam, alguns mesmo sem as pernas, tentavam rastejar em nossa direção.
Em baixo do carro havia uma poça no chão, abaixei e senti o cheiro da gasolina que havia vazado. Corri até o portão de onde tínhamos saído, em vão, ele não abria por fora.
Abri o porta-malas e peguei um machado, acho que teríamos que encarar a orda.
_ Vamos, meninas! Não vai ter jeito, peguem mais uma arma e vamos deixar o carro aqui, precisamos nos abrigar em algum lugar. Eu falava tentando encorajá-las, enquanto tentava pensar em algo.
_ Mas aonde? Aonde vamos, amor?
_ É, Alex, vamos pra onde?
_ Vamos procurar um lugar. Talvez iremos para a Vila da Penha, mas agora precisamos sobreviver.
O primeiro zumbi chegou e foi direto pra cima da Aline, que sem pensar duas vezes passou a foice na barriga do monstro, isso fez seus órgãos ficarem dependurados e ele tropeçar no próprio intestino, mas não foi suficiente para anular a ameaça, ele continuava andando em sua direção.
Cravei o facão em seu pescoço e ele ainda investia para cima dela, que ficou encurralada entre o zumbi e o carro.
_ ABAIXA A CABEÇA! Gritei e assim que ela o fez, consegui acertar a testa de filho da puta com o machado, fazendo escorrer o melado, um sangue quase preto e muito denso.
Aline empurrou aquela carcaça putrefata e com sua foice degolou um segundo zumbi que já se aproximava.
_ NATASHA, DÁ NA CABEÇA, PORRA! Aline gritou e correu no sentido contrário ao que vinha a orda.
Natasha então abriu a tesoura e cravou no olho de um enquanto com um martelo acertava a têmpora da outro.
_ GENTE, AQUI, AQUI! Aline gritou de cima de um muro gradeado, porém baixo de uma casa a alguns metros dali.
Eu e Natasha corremos e também pulamos para dentro do terreno, ficamos ali, olhando os zumbis, que já estavam na grade tentando nos puxar, quando ouvimos o som de um tiro, muito alto, vindo da casa. Viramos para trás, e há uns 5 metros de nós, um velho segurava um revolver.
_ VOLTEM JÁ PELO MESMO CAMINHO, SEUS FILHOS DE UMA PUTA, MINHA CASA NINGUÉM VAI INVADIR, NÃO VÃO ME MATAR COM ESSA COISA!
Ele falou e deu mais um tiro, agora no chão bem próximo aos nossos pés.
_O PRÓXIMO É PRA MATAR! ANDA! VÃO EMBORA! ESTÃO SURDOS?!

Agora éramos nós, o velho armado de um lado e os zumbis do outro, precisávamos de uma solução.  

Ep.2: Atraídos pelo som. Corre, porra!!!

Depois de ter atacado a mulher que rezava, dentro do ônibus, a adolescente, que usava uniforme do Colégio Carmela Dutra, continuou a investir, com um andar cambaleante, na direção dos outros passageiros. Mesmo tendo arrancado seu próprio braço de forma que sua carne dilacerada ficasse toda a mostra, inexplicavelmente o sangue já não escorria mais, como se tivesse coagulado em poucos minutos.
Até agora eu já podia contar cinco vítimas, entre pessoas que haviam sido mordidas, outras com arranhões profundos e por último o corpo da mulher, com a bíblia ainda na mão, caído sobre um banco, com o abdômen completamente aberto, onde a jovem enfiava o rosto e com auxílio das mãos, comia seu intestino e outros órgãos. Eu quase não conseguia acreditar no que estava presenciando, uma menina atacando e comendo pessoas bem na minha frente. A infestação zumbi era real e estava acontecendo bem diante dos meus olhos. Essa vítima caída, que lhe servia de banquete, fez com que outros passageiros, inclusive eu, conseguíssemos ganhar tempo, saindo do alcance daquela besta em forma de adolescente. Puxamos as alavancas das saídas de emergência e pulamos pelas janelas.
O motorista do ônibus também abriu a porta da frente e saiu em meio aos carros, no trânsito da Rua Ministros Edgard Romero. Agora, já estávamos próximos ao Mercadão de Madureira. Corremos para a calçada, os carros passavam por nós, em alta velocidade, como se fossem pilotados por loucos, o que fazia com que o som das batidas de trânsito fosse quase constante.
Em meio à gritaria e pessoas correndo para todos os lados, olhei para frente e reconheci Natasha, uma velha amiga, aparentemente abalada e meio desnorteada.
_ Natasha, vamos embora, vamos pegar um desses carros e vamos apanhar a Aline na casa dela.
Ela me olhava, mas parecia não compreender o que eu dizia.
_ Vamos Natasha, se mexe, porra! Vamos!!!
_ Alex, é você, não é? Porra, não to enxergando nada. Vamos pra onde, cara? Do que você está falando? Tem gente comendo gente, porra! Tem esses monstros nas ruas e pra onde nós vamos? Cadê os meus óculos?
Ela falava, questionava, emendava uma pergunta na outra, sem me dar tempo de responder.
_ Natasha, presta atenção, olha pra mim, olha pra mim! Sabe a Aline, minha namorada? Então, ela está na casa dela e não dá para eu chegar lá. Como as pessoas estão abandonando os seus carros no meio da rua, eu vou pegar um carro para irmos à casa da Aline, buscar ela. Liga pra ela e diz pra ela fazer uma mala com roupas que vamos passar lá e que é pra ela NÃO SAIR DE CASA PARA NADA, frise bem essa parte. Consegue fazer isso?
_ Consigo. Ela respondeu já com o celular na mão.
Andei alguns metros e encontrei um Corsa Sedan, com a chave na ignição. Já era o suficiente, manobrei e voltei ao ponto onde tinha deixado Natasha, ela não estava mais lá. Buzinei algumas vezes, até que saí do carro e gritei seu nome, enquanto abria o porta malas. Mas ele estava vazio, nada que eu pudesse usar para me defender desses zumbis.
Parecia que o barulho atraia ainda mais as criaturas, que agora já estavam em maior número e vinham em minha direção. Natasha apareceu, vinha correndo de dentro do Mercadão.
_ Corre, porra! O som da buzina atraiu ainda mais desses bichos. Gritei, fazendo-a se apressar.
Entramos no carro e seguimos em silêncio, o bairro de Madureira e provavelmente toda a cidade já estavam completamente abandonados, lojas fechadas, muitos carros, motos e ônibus abandonados nas pistas, alguns inteiros e outros batidos. Por todos os lados havia Zumbis comendo corpos, às vezes mais de um compartilhando um mesmo cadáver. Ligamos o rádio e em todas estações uma mesma mensagem era repetida incessantemente:
Estamos em estado de emergência, não saiam de suas, estoquem água e comida”
Estamos em estado de emergência, não saiam de suas, estoquem água e comida”
Finalmente chegamos à casa da Aline, minha namorada. Larguei o carro e assim que abri o portão, um rastro de sangue subia as escadas, saindo da casa de baixo em direção à sua casa, ouvi um homem, que gritava, no quintal da casa vizinha. Ele atirava em um zumbi, enquanto esse continuava caminhando em sua direção. A porta da frente estava trancada, corri para a porta dos fundos chamando seu nome.
Ouvi sua voz, um pouco abafada, pedindo socorro. Entrei pela cozinha e ao seguir pelo corredor me deparei com James, seu padrasto. Ele também já estava infectado, tentava entrar no quarto, para atacá-la, mas a porta estava fechada. Comecei a perceber que além de vagarosos e cambaleantes, não têm consciência do uso de sua força e nem inteligência para tentar pensar em alternativas para atacar suas vítimas. Ao perceber minha presença ele desistiu da porta e veio em minha direção, peguei uma das cadeiras de ferro da cozinha e bati com toda força da região de seu maxilar, o que fez com que abrisse um buraco na lateral de seu rosto, deixando sua carne pendurada e expondo alguns poucos dentes que sobraram no maxilar, agora torto. Estávamos no corredor e ele continuou vindo em minha direção. Ouvi pratos caindo na cozinha e o som do canário que cantava alucinadamente até ser calado de forma abrupta. Olhei para trás e vinha a Aidê, faxineira da casa, com o canário ensanguentado na mão e o rosto coberto de sangue e penas.
Agora eu estava encurralado no corredor entre a cozinha e a sala com um zumbi de cada lado, não havia saída ou alguma forma de fugir, era preciso pensar rápido.   

Ep.1: Infestação, o primeiro contato.

Hoje eu acordei, me arrumei e saí para o trabalho, como faço todos os dias. Fui ao ponto de ônibus, embarquei e, como é comum, peguei um grande congestionamento. O calor piora tudo. A condução se torna um grande forno, um invólucro de metal sob um sol de quarenta graus.
Comprei uma garrafa de água, pela janela, em um dos ambulantes e aproveitei para olhar para a frente tentando ver qual seria o motivo do congestionamento. Era um acidente. Um carro havia batido em um poste. A pancada foi tão forte que o poste estava tombado e um corpo estava debruçado na janela do motorista, havia muito sangue, mas a distância não me deixava distinguir muita coisa.
Viaturas da polícia, do corpo de bombeiros e muitos curiosos obstruíam a passagem dos outros carros. Conforme o ônibus em que estava foi se aproximando do acidente, percebi que toda a lateral do carro batido estava perfurada de tiros e o acidentado também parecia ter sido alvejado, mas, ainda assim, se mexia e tentava sair pela janela, mas estava preso pelo cinto de segurança. O burburinho foi geral, todos comentavam o absurdo que era os policias e os bombeiros não ajudarem o homem que tentava sair do carro. O banco do carona estava vazio e tinha duas crianças no banco de trás, todos aparentemente mortos. Meu ônibus parou novamente, dessa vez quase de frente para toda essa cena. Ouvi dois policiais conversando:
PM 1: - Cara, ele já tinha morrido na hora em que eu cheguei. Aí os bombeiros conferiram os batimentos cardíacos de todos os corpos dentro do carro e nada! Foi todo mundo pro saco. Então, o pessoal, pediu ajuda pra remover os corpos das ferragens e, do nada, quando o Campos tentava livrar a perna do motorista presa no painel do carro, cara, o desgraçado mordeu o Campos, cara... Na hora nós já largamo o dedo nesse filho da puta e ele não morreu! Não fode! Eu também fui mordido na mão, olha aqui. Isso é coisa do tinhoso, só pode! Bem que o meu pastor falou que o fim estava próximo. E, porra, ainda te digo mais, não foi uma mordidinha não. O filho da puta arrancou o pedaço do ombro do Campos e comeu. Ele mastigou e engoliu.”
PM 2: _ Que porra é essa, cara? Tu tá maluco? Como o defunto vai morder os outros? Claro que ele não tinha morrido, porra! Tu está todo ensangüentado, ele te mordeu feio, então, né? Hahahahaha! Já viu essa porra? Não é melhor ir no médico? Tu tá pálido, com a boca branca, porra. Dá pra ver que tu tá todo fodido, todo zoado. Pede para um bombeiro limpar isso, fazer um curativo e vai embora pra casa não tem sentido algum você ficar aqui.
Uma mulher dentro do ônibus começou a falar interrompendo o assunto dos PMs.
A mulher disse que o carro estava ali desde a noite anterior e ela parou com o filho e a nora enfermeira, para ajudar o motorista, que aparentava ter por volta dos trinta anos, a esposa e os dois filhos. O homem estava quase desacordado e não conseguia falar. Apenas alguns grunhidos pareciam a tentativa de pedir ajuda, enquanto apontava a mulher do banco do carona. Deram a volta no carro para tentar ajudá-la, mas ela já estava morta. Parecia que estava morta há vários dias. Sua nora conseguiu tirar o corpo da mulher do carro e enquanto fazia isso, também havia sido mordida. A nora passou muito mal durante a noite e foi levada às pressas ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha. Hoje pela manhã, começou a vomitar um líquido viscoso e escuro. Ela não resistiu e morreu. Os médicos disseram que nunca viram nada parecido.
- As crianças estão se mexendo! - gritou um bombeiro.
- Apesar dos ferimentos por todo o corpo os meninos ainda estão vivos!
O grito ecoou fazendo com que todos ao redor começassem a gritar, clamando para que eles fossem ajudados. Na mesma hora a multidão de curiosos começou a se mobilizar e começaram a tentar cortar a lataria do carro.
O ônibus voltou a andar, alguns guardas municipais liberaram o trânsito à frente. Já estávamos longe do local do acidente, quando mais gritos fizeram o motorista parar no meio da rua. Uma adolescente atacou a mordidas o senhor sentado ao seu lado. Várias pessoas tentaram ajudar o homem e também foram mordidas, tiveram pedaços de seus corpos arrancados ou sofreram arranhões profundos.
Com muito esforço conseguiram amarrar a jovem pelo braço, com algumas alças de bolsas e mochilas. Ela rosnava, grunhia, e babava. Seus olhos não pareciam olhos humanos, sua pele era pálida como a de um cadáver e ela parecia não sentir dor alguma. Uma mulher pegou a bíblia em sua bolsa e começou a fazer orações, como se tentasse exorcizar a menina. Enquanto isso, a adolescente girava o braço que estava preso, fazendo arrebentar a articulação do ombro. Ela continuou a torcer até que o sangue começasse a banhar seu corpo, enquanto sua carne era dilacerada pelas torções.

Por fim o braço se soltou do corpo, ficando amarrado ao banco, enquanto a menina sem demonstrar nenhuma dor foi de encontro à mulher que rezava, mordendo sua jugular e fazendo com que as artérias espirrassem o sangue, banhando o ônibus e a todos em seu interior.